quarta-feira, 24 de abril de 2013

ARTIGO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO III

Parte III,  final do artigo de Engenharia de Produção, produzido por Mário Sacomano NetoI; Edmundo Escrivão FilhoII
IDepartamento de Engenharia de Produção, Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, E-mail: pmsn@iris.ufscar.br
IIDepartamento de Engenharia de Produção, Escola de Engenharia de São Carlos – USP, E-mail: edesfi@prod.eesc.sc.usp.br


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5. Análise da Mudança Estrutural e a Formação das Equipes
Buscar a compreensão e o entendimento das mudanças nas organizações é extremamente instigante e não é tarefa simples. Cada organização tem um "dialeto" próprio para a manifestação de como as tarefas se realizam dentro do complexo de informações e relações que compõe a estrutura organizacional. Assemelha-se a um caleidoscópio, sempre mutante aos olhos, mas que mantém rigorosamente sua geometria, enquanto não se muda o instrumento.
Quanto ao tipo de estrutura encontrada nas empresas, percebe-se uma combinação variada dos tipos tradicionais, principalmente a estrutura linha-assessoria e matricial, com diferentes tipos de departamentalização, entre eles, por produto, processo, geográfica e celular. Este fato reflete a dificuldade no processo de caracterização dos diferentes tipos de estrutura e de departamentalização encontrados nas empresas pesquisadas. Identificou-se que as estruturas organizacionais têm tornado-se crescentemente mais enxutas, buscando focos de atuação para a realização de suas atividades produtivas.
Nas empresas que realizaram desverticalização estrutural, as áreas de apoio foram as primeiras atividades a serem terceirizadas, por não pertencerem à competência ou ao know-how das empresas. Este fato proporcionou um enxugamento estrutural nas empresas pesquisadas, que buscam a delimitação dos focos de atuação e das atividades que agregam diretamente valor aos produtos.
As assessorias fornecem um suporte importante para as estruturas organizacionais nas empresas pesquisadas. Nas empresas onde a estrutura é por linha e assessoria, estas atividades são ligadas diretamente à estrutura, embora não tenham uma subordinação similar aos outros departamentos. Na estrutura matricial da Empresa 4, estas assessorias compõem as linhas horizontais da matriz, mostrando a importância de combinar profissionais mais técnicos e mais generalistas. Na Empresa 2 as assessorias estão diretamente ligadas às células de produção. Na Empresa 3 a assessoria é um dos processos de suporte. Estas atividades de apoio voltam-se principalmente às atividades de recursos humanos, qualidade, finanças, tecnologia de informação, entre outras.
A descentralização da autoridade das empresas pesquisadas, principalmente aquelas que desverticalizaram sua estrutura, volta-se principalmente aos aspectos ligados ao trabalho operacional, tais como: requisição de material, manutenção de equipamentos, qualidade, tecnologias, planejamento de férias, logística. Percebeu-se uma preocupação das empresas em integrar estas atividades aos processos de produção. Na Empresa 2 estas atividades fornecem suporte aos processos de produção, gerando maior autonomia nos níveis operacionais. A autonomia quanto aos aspectos operacionais é crescente, principalmente com a implantação das equipes de trabalho que facilitam a flexibilidade e rapidez no processo decisório.
Quanto à tipologia das equipes, encontrou-se a utilização das equipes operacionais pelo menos nas quatro primeiras empresas. Na Empresa 3 foram instituídas as equipes abertas, que apresentam um alto grau de flexibilidade, em função da adequação do tipo de equipe para determinado problema. Na Empresa 4, além das equipes operacionais, também foram encontradas as equipes de eficiência, qualidade e melhoria dos produtos.
A cultura voltada para as equipes depende essencialmente do contexto em que as mesmas foram criadas. Nas Empresas 1 e 4, o esforço para a disseminação desta característica é fundamental para o bom funcionamento das equipes. Nas Empresas 2 e 3, as dificuldades foram mais amenas para a criação desta cultura, em função da diferenciação da mudança estrutural destas empresas em relação às demais. A Empresa 2 criou uma estrutura nova e a Empresa 3 expandiu sua estrutura. A diferenciação destas empresas está exatamente na "mudança" da cultura para a criação das equipes em contrapartida à "criação" da cultura para a formação das equipes.
Os conflitos ocorrem em qualquer forma de organização social. Nas empresas este fato depende da abertura dos níveis gerenciais para a resolução dos mesmos e das relações sociais estabelecidas entre os membros. As quatro empresas estimulam a resolução dos conflitos no próprio nível operacional, e quando não resolvido, o problema sobe na escala hierárquica para a sua resolução.
A liderança encontrada nos níveis operacionais das empresas, principalmente nas empresas 1, 2 e 4, volta-se ao elemento facilitador da equipe, que intermedia a relação entre os níveis operacionais e os níveis gerenciais. Em algumas empresas este líder incorpora inclusive atividades administrativas. Na Empresa 1 o líder é rotativo, estimulando todos a realizarem esta atividade, nas demais o líder é fixo. Nas Empresas 2, 3 e 4, o líder pode ser escolhido pelos níveis gerenciais, mas também se acata as sugestões de indicação dos níveis inferiores.
A Empresa 1 partiu, desde alguns anos atrás, de uma cultura autocrática para uma cultura participativa. A mudança estrutural no sentido de descentralização foi intensa e a formação das equipes significou um suporte fundamental à flexibilidade dos processos de produção. Entretanto observa-se uma estrutura ainda tradicional; reforçou-se desta forma uma mudança principalmente no comportamento e na cultura participativa, embora a estrutura não apresente inovações quando comparada às outras empresas.
A Empresa 4 obteve uma mudança estrutural no sentido de uma descentralização, antes estruturada de forma funcional e passou a ser estruturada de forma matricial. Nesta estrutura as equipes fornecem um suporte indispensável à realização das atividades, principalmente pela interação entre as linhas que compõe a matriz. Esta empresa inovou na instituição das equipes de eficiência, qualidade e novos produtos.
A Empresa 3 obteve uma mudança estrutural no sentido de expansão de suas atividades. Antes estruturada funcionalmente, passou a ser estruturada por processos. Sua inovação está na horizontalização da estrutura. Considera-se três grandes processos ao invés de muitos departamentos, facilitando a eficiência do conjunto corporativo. A formação das equipes forneceu um suporte importante para tais mudanças. As equipes abertas são extremamente flexíveis e mostram-se como uma alternativa adequada aos momentos de grandes mudanças e problemas adversos.
A Empresa 2 teve sua estrutura organizacional criada por meio de um projeto extremamente inovador. Do ponto de vista estrutural, percebe-se a delimitação essencialmente na produção, e as atividades de logística, manutenção, tecnologia e qualidade são diretamente ligadas aos processos de produção, que mostra a concepção das células de produção. Este fato evidencia uma adequação da estrutura organizacional aos objetivos da empresa. Esta adequação fornece o suporte necessário para a realização eficiente das atividades, onde o foco está na produção e as demais áreas dão apoio.

6. Considerações Finais
Conforme as informações colhidas na pesquisa, as mudanças no sentido de uma desverticalização têm um impacto mais profundo, ou exigem adaptações profundas principalmente na disseminação de uma nova cultura. As mudanças estruturais com expansão, como na Empresa 3, têm a vantagem que as pessoas novas já se incorporam a um novo sistema estrutural. A Empresa 2 teve a oportunidade de planejar um projeto organizacional condizente com seus objetivos, diferente das Empresas 1 e 4, que reprojetaram a organização ao longo de sua existência.
Percebe-se como descrito em cada empresa, partindo do desenho da Empresa 1, passando em seqüência pelas empresas 4 e 3, até o da Empresa 2, uma evolução do desenho estrutural. Quando se observa cada estrutura percebe-se diferenciais na forma de representação e que facilitam ou dificultam a formação das equipes de trabalho.
Presume-se que a estrutura tenha que suportar não só seu aspecto formal de poder, responsabilidade e controle. A estrutura tem um escopo mais amplo de variáveis e elementos que a compõe. As estruturas horizontalizadas têm novos desafios: lidar com a informação rápida, utilizando autonomia de decisões. Isto requer um desenvolvimento organizacional em conjunto, tanto da filosofia da organização, como dos gerentes e operários de nível operacional.
O papel da estrutura organizacional também é discutido por HANDY (1997). O autor coloca que o poder nas novas organizações provém das relações e não das estruturas. A confiança sendo o principal meio de controle, torna as pessoas mais eficazes, criativas e capazes de atuar em um ambiente dinâmico. Esta colocação corrobora com a visão de que a função da estrutura não está somente na designação do poder, mas sim nas relações que a mesma implica.
No mesmo sentido DRUCKER (1998) ressalta que as mudanças organizacionais estão centradas principalmente no indivíduo, no funcionário qualificado e dotado de cultura. Sua análise parte da perspectiva de que nas organizações o conhecimento é o principal fator e as pessoas são de igual importância para o funcionamento do sistema. As relações devem ser pautadas como nas equipes de trabalho, de igual para igual, e não de superiores para inferiores. Neste sentido cabe uma discussão importante acerca das questões culturais e a relação com a formação das equipes de trabalho. Teriam sido as facilidades culturais, entre outros motivos, que propiciaram altas inovações e produtividade à administração japonesa quando formulou seu processo organizacional baseado em equipes?
Conforme as informações trazidas neste trabalho, as equipes têm sido fortemente utilizadas como uma peça para a flexibilização das estruturas organizacionais, isto é, divide-se a organização em subsistemas menores e autônomos, garantindo a eficiência entre as partes, subsistemas, com o sistema maior.
O trabalho partiu da hipótese que de que as mudanças estruturais fundamentam-se na formação das equipes de trabalho. Pode-se concluir que esta hipótese é válida pois é crescente a utilização das equipes de trabalho principalmente nos níveis operacionais. Embora a implantação das equipes tenha se tornado muito utilizada, é necessário se pensar também em outras modalidades de conformação para que as mudanças requeridas sejam atingidas. Quais seriam estas outras modalidades?
Assim, considera-se que a mudança cultural torna-se importante para a implantação das equipes; portanto, todo projeto de mudança estrutural exige que se pense em muitos aspectos e nas peculiaridades de cada empresa.
Por outro lado, a gerência é um importante ponto de referência para a disseminação das novas idéias; sem o comprometimento desta, as estratégias para a implantação de inovações não se consolidam. A pesquisa revelou que a média e alta gerência tem aumentado a visão holística da empresa, assim como uma relação mais humanista com o trabalho, apesar das adversidades apresentadas pela crise econômica vigente nos últimos anos. Pode-se afirmar também que o trabalho em equipe tem sido elemento favorável ao crescimento deste clima dentro das organizações.
A estrutura tem que oferecer um papel agregador para o funcionamento das equipes permitindo que prosperem relações apropriadas à formação das mesmas. Desta forma a estrutura deve considerar as relações formais e informais que a mesma contempla. Em vista deste fato detectado na pesquisa, o papel da estratégia em uma nova formalização das atividades de recursos humanos deve prosperar junto com as mudanças estruturais.
layout contribui para a aproximação das pessoas, eliminando paredes e portas, facilitando o processo comunicativo. É significativa a presença de local apropriado para reuniões como no layout da Empresa 2, onde as equipes de trabalho se reúnem com muita freqüência para a resolução de problemas que surgem durante a execução das tarefas. Durante a pesquisa, e por várias oportunidades, foi chamada a atenção para a importância deste espaço de discussão inclusive de problemas pessoais dos membros da equipe. É evidente que se chamou à atenção para um símbolo da atividade em equipe que lhe confere a autonomia no trabalho.
Um fator de influência para a formação das equipes é que as pessoas que as integram têm pensamentos, personalidades e formações diferenciadas, dificultando uma sinergia dos elementos. Quando acontece esta sinergia ou espaços de discussão dos problemas, a equipe caminha bem, quando não, há uma desintegração.
Outro elemento importante para as empresas que realizaram uma mudança estrutural é o fato de se trabalhar muito tempo com um tipo de estrutura. A estabilidade e a conformidade criam resistência à mudança. Assim, as pessoas quando envolvidas em equipes têm dificuldades de assumir lideranças, posicionamentos, iniciativas, por serem aculturadas por um tipo de estrutura que não estimulava estas habilidades.
Todos estes elementos levam um longo tempo de adaptação, pois qualquer mudança quando feita fora de um processo de negociação aberta, causará impactos e resistências. Como destacado anteriormente, a formação das equipes depende de um amplo projeto organizacional que adapte variáveis de diferentes naturezas, algumas delas foram destacadas anteriormente.
Foram inúmeros os benefícios apontados pelas empresas pesquisadas com a utilização das equipes, estando entre eles o trabalho mais eficiente e motivador, e a tomada de decisão mais flexível; embora seja necessária uma maior preocupação com as melhorias das condições sociais dos trabalhadores que participam deste movimento, tanto nos aspectos financeiros como relacionamento, entendimento e humanização das relações de trabalho.

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